quarta-feira, 6 de maio de 2009

Obama

OBAMA, CUBA E A AMÉRICA LATINA

Mauro Santayana – Jornal do Brasil, Rio de janeiro
Domingo, 19.04.2009



O povo norte-americano não conheceu os dissabores do colonialismo,
como os conhecemos. O povoamento do território começara pouco antes do
confronto que, na Inglaterra, opusera os Comuns e os Stuart, e
manteria a tensão política na Grã Bretanha até a Glorious Revolution
de 1688, não deixando tempo para outras preocupações. No século 18,
com a expansão imperial inglesa na África e na Ásia, Londres tampouco
se preocupou com a América: ali só havia bons ingleses, cnservadores
de sua cultura e de suas crenças. Não havia por que temê-los, nem por
que os tratar com arrogância.
As tensões internas nos Estados Unidos só se iniciaram com a expansão
ao Oeste e ao Sul, que os levou a dizimar povos autóctones, a comprar
territórios vizinhos, como os do Vale do Mississipi (incluindo a
Luisiania), da França, e o Alasca, da Rússia, e a invadir estados
soberanos, como fizeram com o México, no qual se apoderaram de 1,3
milhão km2. Pensando como europeus, os norte-americanos deles herdaram
a ideia de supremacia sobre os vizinhos. Sentiam-se no direito de
estender a “civilização”, substituindo os espanhóis na exploração dos
bárbaros do Sul. É de se lembrar que “humanistas” da Europa aplaudiram
a guerra contra os mexicanos, ocorrida entre 1846 e 1848.
Essa visão preconceituosa, aliada à ganância de lucro dos homens de
negócios, separou a América do Norte dos povos latino-americanos. Os
países que mais sofreram foram os menores, como os da América Central,
que se transformaram em repúblicas bananeiras, exploradas pelas
companhias norte-americanas, entre elas a famigerada United Fruit. Os
países meridionais, ainda que distanciados, também sofreram e ainda
sofrem seu domínio político e econômico. Há ainda a registrar sua
frequente intervenção nos assuntos internos latino-americanos, como na
Guerra do Chaco entre o Paraguai e a Bolívia, e a promoção de
sangrentos golpes de Estado, entre eles os do Chile, da Argentina e do
Brasil.
Há um passivo difícil de ser liquidado. Ele é ainda maior no caso de
Cuba. O governo Eisenhower não conseguiu entender o objetivo real da
Revolução Cubana, que era, além de melhorar a vida de seu povo, o de
derrubar Batista e impor a moralidade burguesa aos costumes de Havana,
com o fechamento dos bordéis e o controle dos cassinos explorados pela
máfia de Chicago. Poucos dos revolucionários ( o Che entre eles)
imaginavam ser possível um regime socialista na ilha. A pressão dos
poderes de fato dos Estados Unidos levou o governo de Washington a
iniciar sua hostilidade contra os revolucionários, hostilidade que
cresceu no governo do presidente Kennedy, tão louvado pelos que não
conhecem bem a raiz quadrada da História. Castigados primeiro pela
ocupação direta dos Estados Unidos, amputado o seu território com o
enclave na Baía de Guantánamo, que perdura em suas costas como bócio
incurável; submetidos ao bloqueio econômico, os cubanos buscaram o
apoio soviético. E foi esse apoio, aliado à posição de alguns governos
latino-americanos da época, entre eles, de forma firme, o Brasil, que
impediu Kennedy e seus sucessores de arrasarem o país e seu povo.
Raúl Castro aceitou negociar com os Estados Unidos, de “igual para
igual”. Se isso vier a ocorrer, será a primeira vez. Desde que os
americanos intervieram na guerra de independência de Cuba e, vencendo
a Espanha, ocuparam a ilha, os cubanos são tratados com desdém.
Qualquer seja a opinião que tenhamos de seu regime e de seus
dirigentes, é admirável sua resistência ao longo de quase meio século.
Raúl não se opõe a mandar para os Estados Unidos os dissidentes do
regime que se encontram presos e suas famílias, e só exige que cinco
cubanos, prisioneiros na Flórida, sob a acusação de espionagem, sejam
devolvidos à pátria. Diante disso, será difícil continuar o bloqueio
contra a ilha.
De qualquer forma é estranho que os Estados Unidos, que mantêm a
prisão de Guantánamo, uma afronta aos princípios elementares de
justiça; que confessadamente sequestram e torturam cidadãos
estrangeiros; que invadiram o Iraque e patrocinaram a farsa do
julgamento e a oprobriosa execução de Saddam Hussein, falem de
respeito aos direitos humanos em Cuba.
Resta saber se eles, sob Obama, estão decididos a respeitar a
soberania de Cuba, nas negociações que se articulam, ou desejam
simplesmente restaurar a democracia dos tempos de Gerardo Machado e
Fulgêncio Batista, seus fiéis vassalos.

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