Da revista Veja
14/10/2011
às 15:15
Dilma, que tenta dar lições ao mundo, deveria aprender ao menos uma com George W. Bush. Sim, ele mesmo!
Harriet
Miers, tida como competentíssima, não foi indicada por Bush para a
Suprema Corte em 2007 porque tinha sido sua advogada em 1994. A imprensa
caiu de pau. No Brasil, a gente não dá bola pra isso...
Podem
discordar de mim à vontade. Pouco me importa que alguns pensem isso ou
aquilo das minhas opiniões. O fato é que milhares de leitores vêm em
busca dela, certo? Alguns ficam chateados com isso. Fazer o quê? Pensem
de mim o que lhes der na telha. Parece-me, no entanto, perda de tempo
supor que sou ingênuo.
Critiquei a escolha que a presidente Dilma
Rousseff fez para o TSE: nomeou Luciana Lóssio, que foi sua advogada na
eleição de 2010. E não reconduziu ao cargo Joelson Dias, que os petistas
passaram a considerar um adversário. Para uma República que se leve a
sério, isso é inaceitável. Os que me supõem, então, ingênuo
argumentaram: “Ah, mas Luciana já foi advogada de Roseana Sarney, de
José Roberto Arruda, de Sandro Mabel…” Imaginaram, talvez, que escrevi o
post desta manhã ignorando isso. Ora… Eu sei que Dilma não tem um
criadouro de advogados pessoais em casa.
E daí que a nova ministra
substituta do TSE já tenha advogado para outras pessoas? Isso não tem a
menor importância. O que importa é já ter sido advogada de Dilma. Isso
tem importância. Preparei este post com especial carinho para os que me
apresentassem essa argumentação. Então vamos ver como funciona uma
república.
Na madrugada desta sexta, o ex-cineasta e humorista
Arnaldo Jabor teve mais um ataque de delirum tremens por causa da
síndrome de abstinência de George W. Bush. Está a cada dia mais
engraçado. Se a ministra Ira-ny conseguir tirar o quadro da Valéria e da
Janete do ar, acaba no Zorra Total. Exaltou o povo na praça contra Wall
Street (nada para os brasileiros que protestam contra a corrupção…) e
atacou os republicanos. Coisa surpreendente, né? Eu acho que ele está
convicto de que suas opiniões interferem no comportamento do eleitorado
americano, hehe. Pois é… Os EUA são mesmo um país coalhado de idiotas,
né?
Há uma fantasia vagabunda segundo a qual o Brasil, hoje em dia, é
exemplo para o mundo. Em má situação estariam, por exemplo, os EUA.
Eles, sim, não sabem como sair da crise. No Bananão, como diria Marilena
Chaui, temos Lula e os petistas para iluminar o debate. Um dia a crise
americana acaba, é claro, e vamos encontrar um país que, ao menos, manda
os seus bandidos para a cadeia. Por aqui, já escrevi, costumamos mandar
os nossos para o poder.
Aquela idéia que já se prestou ao ufanismo
cretino de que somos um país rico com um povo pobre não é de todo
infundada. O Brasil chegou ao século 19 como a maior economia das
Américas. Entre 1800 e 1900, seu PIB passou a ser um décimo do PIB dos
EUA. Criamos, ao longo do tempo, instituições ruins. Elas nos empobrecem
ou tornam nossas vantagens irrelevantes. Uma reportagem de 2009 falava
da possível riqueza do pré-sal e demonstrava como ela estava sendo
engolfada pelo estatismo mais primitivo. Qual Estado? Um Estado
essencialmente corrupto. Temos uma história. Vamos ver se temos também
um destino.
Lembram-se de George W. Bush? Sim, aquele, o odiado das
gentes, a droga de Arnaldo Jabor… Em 2009, contei aqui para vocês uma
história exemplar. No ano de 2007, o então presidente dos EUA indicou
Harriet Miers, com 60 anos, para a Suprema Corte. Ela não era, assim,
uma Luciana Lóssio, a advogada de Dilma… Formada em matemática e
direito, era conselheira jurídica da Casa Branca, chefiava um escritório
de advocacia de 400 pessoas e era tida como uma das profissionais mais
influentes do país em sua área. Só que havia um problema: em 1994,
Harriet era advogada de Bush, então governador do Texas. A grita nos EUA
foi tal que o presidente americano foi obrigado a retirar a sua
indicação. Como as coisas por lá funcionam de outro modo, Harriet pediu
demissão até do cargo de assessora. A imprensa não perdoou: considerou
simplesmente inaceitável, embora não fosse ilegal, que uma ex-advogada
do presidente fosse parar na Suprema Corte.
No Brasil, Luciana
Lóssio, ex-advogada de Dilma, foi para o TSE. Ainda que, para a
presidente, a formação intelectual seja critério influente, é evidente
que a ética ficou fora da jogada. Não temos o país que impediu Bush de
nomear a competentíssima Harriet. Temo o país que permite nomear a
amicíssima Luciana.
Ora, minhas caras e meus caros, coisa assim não
são manifestações isoladas. Pertencem a uma narrativa maior. Lembram-se
do trambiqueiro Bernard Madoff. Está puxando uma cana brava nos EUA. No
Brasil, os Madoffs da vida estão financiando campanha, escrevem livros e
são prestigiados por altas autoridades da República.
É por isso que é, sim, preciso sair às ruas e começar a ocupar as praças!
Por Reinaldo Azevedo